Análise: com nome japonês e elenco coreano, dorama ‘Pachinko’ traz reflexões sobre identidade cultural

Tendo nome japonês, equipe coreana e produção americana, a série Pachinko conqusitou o prêmio de melhor produção estrangeira no Critics Choice Awards deste ano. Num recorte dos últimos anos, a Coreia do Sul seja em produção própria ou em coprodução, repete o feito com Minari em 2020 e Round 6 no ano passado.

Sucesso na literatura, Pachinko tem uma história forte em seu melodrama que aborda mulheres coreanas que migraram para Japão no período em que o país fazia parte de seu território. O nome que dá origem ao livro e à série vem do jogo de azar que surgiu na indústria japonesa, mas acabou migrando para as mãos dos coreanos que residiam no Japão, sendo até hoje em torno de 90% responsáveis pelos 16 mil pontos espalhados em todo território nipônico

Numa história que soa familiar a comunidade nipor-brasileira, a história de Pachinko bate na tecla que essas pessoas não se identificam nem como coreanas e muito menos japonesas. Ficando refém ao subterfúgio de uma sociedade japonesa que não deu voz a estrangeiros que residem em seu país.

Produção da Apple TV Plus, a série em sua primeira temporada, optou por uma narrativa que mistura momentos da história da família de Kim Sunja, mostrando tanto ela saindo da Coreia, como a história de seu neto nos anos de 1980 num Japão repleto de preconceitos.

Trazendo um elenco de peso com Kim Sunja sendo interpretada jovem por Kim Min-ha e em sua idade mais velha por Youn Yuh-jung (Minari). O galã das séries coreanas, Lee Min-ho, interpreta Koh Hansu, um coreano residente do Japão que acaba engravidando Kim Sunja fugindo do clichê que o ator talvez esteja tão acostumado.

O sucesso da produção foi tanto, que Pachinko não só foi premiado, como está garantindo uma segunda temporada que continuará abordar histórias ainda não exploradas do livro original.

Para fãs de Haru to Natsu da NHK, Pachinko tem muito em comum. Optando por legendas de cores diferentes para os idiomas japonês e coreano, a série seguiu um caminho que não só brilhou pela sua qualidade técnica, mas por sua ousadia ao trazer diferenças gráficas em inglês, coreano e japonês na tela.

Que a sorte esteja ao seu lado

Pachinko hoje em dia

Criado em 1920, as máquinas de pachinko foram construídas influenciadas num jogo chamado de korinto gēmu. Nascendo em Nagóia, o jogo se espalhou por todo o Japão na década de 1930, porém com a Segunda Guerra Mundial acabou sendo fechado, ressurgindo anos depois.

Criado como um jogo mecânico, Pachinko permaneceu igual até a década de 1980, quando foi atualizado se tornando eletrônico como conhecemos ele hoje em dia. No jogo você tem objetivo de obter três números/símbolos em uma fileira para ganhar um jackpot.

Em 1954, fabricantes japoneses desistem do Pachinko devido a casos de vícios de jogos, o que fez com que coreanos assumissem se mantendo na indústria até hoje.

Melodrama inteligente

Koh Hansu com a jovem Kim Sunja – Divulgação

A série dividida em 8 episódios, tem início na década de 1900, quando conhecemos a jovem Kim Sunja (Kim Min-ha) que é filha de um pescador e acaba conhecendo o misterioso Koh Hansu. Ele veio do Japão e controla a região devido a influência que o país tem com a Coreia naquela época.  Infelizmente Kim Sunja acaba engravidando e quando acredita que poderá se casar com ele, descobre que ele não só é casado, como sua noiva se encontra no Japão.

Desonrada e grávida, acaba que ela conhece o pastor Baek Isak (Noh Sang-Hyun) que se hospeda na casa de sua mãe e conhecendo a situação, acaba se casando com ela. Isso acaba fazendo com que ela seja obrigada a se mudar para o Japão,.

A história de Pachinko é focada na família de Kim Sunja, em que tem dois filhos, além de netos que continuam o seu legado. Trazendo valores e batendo de frente com uma sociedade que ignora os Zainichi Kankokujin (Coreanos residentes do Japão), Sunja mostra a luta árdua para manter a sua família de pé.

Pachinko opta por manter as duas narrativas simultâneas, em que parte se passa entre 1915 a 1938, enquanto a outra parte da história se passa em 1989.

Em 1989, temos o neto de Sunja, o Baek Saloman (Jin Ha) trabalhando numa empresa multinacional e sendo transferido para o Japão. Aqui, ele acaba tendo que negociar com uma senhora coreana a compra de um terreno, porém pensando nas palavras de sua avó, ele cancela a compra o que acarreta na sua demissão. Trazendo problemas da década de 1980, temos bolha financeira e imobiliária sendo explorada, mas também  AIDS e outros pontos que fazem Saloman questionam se ele realmente deseja ficar no Japão.

Não podemos deixar de citar que a história de Sunja não acaba aqui, porque ela finalmente consegue visitar a Coreia do Sul, revendo sua terra, costumes e também em busca de informações do túmulo de sua mãe. O se reencontro ao passado faz com que ela se esbarre com a situação que agora ela era uma estrangeira em seu país natal.

Pachinko brilha em sua história, mas o grande diferencial da série da Apple TV Plus foi em trazer a narrativa em diferentes tempos, dando oportunidade de diversos pontos da história da Sunja serem colocados lado a lado.

A série logicamente toca na ferida entre Coreia e Japão diversas vezes. Esse incômodo é intencional e está presente em produções sul coreanas, não sendo inédito e até comum.

A chance de se emocionar com a história de Kim Sunja é alta e os produtores ainda guardam uma série de entrevistas com diversas mulheres coreanas que vivem no Japão e que carregam histórias muito parecidas com a dela. Até o final de Pachinko, você terá que ter um lenço do seu lado, porque irá se emocionar e talvez se revoltar com a história delas.

Texto originalmente escrito para o Nippon Já

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Giuliano Peccilli
Giuliano Peccillihttp://www.jwave.com.br
Editor do JWave, Podcaster e Gamer nas horas vagas. Também trabalhou na Anime Do, Anime Pró, Neo Tokyo e Nintendo World.

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