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Crítica | Com verdades amargas, Oh, Canada traz Richard Gere irreconhecível

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Estreando nos cinemas, Oh, Canada é um filme que chama atenção por seu elenco, trazendo Uma Thurman, Jacob Elordi e Richard Gere como protagonista. Novo trabalho de Paul Schrader, o drama retrata os últimos dias do diretor Leonard “Leo” Fife, que, com a ajuda de seus antigos alunos, grava um documentário revelando seus maiores segredos.

A produção marca a segunda colaboração com Schrader desde Gigolô Americano (1980) e traz um filme mais intimista, com cara de orçamento modesto, cujo foco está nas palavras de seus personagens.

Se, em seus últimos dias, Leonard “Leo” Fife decide revelar seus segredos, Emma (Uma Thurman) se questiona se o documentário precisa ser tão íntimo e expor a vida que ela construiu com ele.

Mas você deve estar se perguntando qual é a história de Oh, Canada. O filme começa com o documentário e um Leonard “Leo” Fife debilitado, mas consciente de que precisa contar sua história.

Longe de outros filmes de Richard Gere, aqui vemos um personagem rabugento, que não tem papas na língua ao revelar seus piores medos. É nesse ponto que voltamos a 1963, com um Leo bem mais jovem, interpretado aqui por Jacob Elordi.

Numa trama narrada pelo “velho” Leo, acompanhamos o cotidiano dos anos 60, em que ele tinha a mulher dos sonhos, enquanto o sogro lhe oferecia um bom emprego, mas que não era suficiente para a sua necessidade de liberdade.

Jacob Elordi

E se no Canadá ele é lembrado por ter fugido dos EUA de um alistamento obrigatório para a Guerra do Vietnã, a verdade é bem mais complexa. Será que ele era realmente feliz com sua vida?

Tentando contar sua história, Leo percebe que as lembranças são traiçoeiras, surpreendendo a todos ao revelar que não só foi casado, como também deixou uma esposa grávida para trás, em sua fuga para o Canadá.

Emma se sente invadida a cada detalhe contado, totalmente desnudado de qualquer moralidade. Ela tenta, diversas vezes, impedir Leo de continuar, mas, dolorosamente honesto, ele não está disposto a parar, principalmente por saber que talvez não exista um amanhã.

Nesta viagem entre passado e presente, vemos que Leo não teve só uma esposa, tendo deixado algumas mulheres ao longo da vida. Sua “fuga” desmistifica o grande herói que ele se tornou nas décadas seguintes.

Mas a história não se limita apenas à voz de Leo, já que também vemos o filho “abandonado” do primeiro casamento conversando com Emma. Mesmo ignorado pelo pai, precisamos olhar além das lembranças dele para entender os que foram deixados para trás.

É aqui que também vemos como ele deixou sua vida anterior e passou a fazer pequenos serviços, até se tornar um cineasta documental conhecido no Canadá. Um trabalho que começou com fotografias e evoluiu até sua consagração.

Essa desconstrução também explica o título do filme, uma fala do próprio Leonard “Leo” Fife. Trata-se de um grito de recomeço, em que novas oportunidades poderiam surgir dali. Mas será que ele conseguiu fugir do seu medo?

Opinião

Richard Gere

Oh, Canada é definitivamente um filme intenso e, inicialmente, bastante confuso. Com uma gravação que parece tentar arrancar verdades de um homem nos seus últimos dias, a narrativa se torna uma viagem entre duas linhas temporais distintas.

Richard Gere entrega um personagem amargurado e incomodado, enquanto Leo, interpretado por Jacob Elordi, mostra uma versão mais humana e falha. Por mais diferentes que sejam, as duas versões do personagem estão muito bem representadas, com destaque para Elordi, que mostra um Leo em construção, sem amarras.

Uma Thurman, por sua vez, entrega uma Emma com medo de que aquela conversa íntima seja exposta na forma de um documentário. É uma personagem humana, que levanta discussões ao longo do filme sobre os limites dessa gravação.

Baseado em Foregone, de Russell Banks, Oh, Canada é um filme particularmente confuso na maneira como conta sua história. Cru e com cenas em preto e branco em momentos-chave, devo confessar que é um filme feito para causar incômodo no espectador.

Leonard “Leo” Fife, interpretado por Richard Gere, quer contar sua história à sua maneira e, mesmo com a idade avançada e lembranças confusas, insiste em sua versão dos fatos. Isso torna a viagem por sua memória truncada e impede o desenvolvimento de alguns personagens do passado, dificultando o entendimento do que aconteceu.

Focado mais nos dias atuais e nos conflitos em torno do documentário, Oh, Canada é um filme que exige atenção o tempo todo, se o espectador realmente quiser compreender aquele personagem. E devo dizer que a forma como a narrativa é construída não torna esse trabalho fácil.

Deixando julgamentos de lado, Oh, Canada apresenta a história de uma pessoa cuja verdade talvez não devesse ser contada, pois sua imagem de herói sucumbiria após a morte. A maneira como expõe suas lembranças é tão crua que nem parece um filme, mas sim uma entrevista interminável que ressalta a indulgência em torno de si mesmo.

Enquanto a narrativa alterna entre o presente, com Leo doente e combalido, e o passado vivido por seu eu jovem (interpretado por Jacob Elordi, em uma atuação surpreendentemente sóbria), Schrader vai desfiando um rosário de arrependimentos. Leo traiu esposas, abandonou filhos, mentiu para os amigos e construiu sua reputação em cima de fantasias convenientes. Cada lembrança, cada confissão, é como uma lasca arrancada da imagem que ele vendeu ao mundo, e que agora se esforça para demolir antes de partir.

Com cerca de uma hora e meia de duração, Oh, Canada é um filme curto em sua narrativa, trazendo lembranças que talvez merecessem ser mais aprofundadas e apresentadas de outra forma. Limitadas a alguns flashes narrados por Richard Gere, que vive um personagem nos últimos dias de vida, essas memórias geram um incômodo que pode agradar a alguns, mas também provoca desconforto ao tentar entender quem ele foi de verdade. Mesmo tirando a máscara imposta por si mesmo para enfrentar a sociedade, sua sinceridade e honestidade no fim geram apenas o incômodo de vê-lo tentando ser honesto consigo mesmo, isentando-se, talvez, mas jogando seus julgamentos e escolhas no colo do espectador.

Nota 3 (de 5)

Oh, Canada

Direção: Paul Schrader
Roteiro: Paul Schrader
Baseado em: Foregone, de Russell Banks
Produção: Tiffany Boyle, David Gonzales, Meghan Hanlon, Scott LaStaiti, Luisa Law
Elenco principal: Richard Gere, Jacob Elordi, Uma Thurman
Cinematografia: Andrew Wonder
Edição: Benjamin Rodriguez Jr.
Música: Phosphorescent
Distribuição: Kino Lorber
Duração: 91 minutos
País: Estados Unidos
Idioma: Inglês
Estreia: 05 de junho

Agradecimentos a Sinny e a California Filmes pelo convite e produção deste conteúdo.

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